terça-feira, 31 de maio de 2011

Pros ratinhos de biblioteca

Esse evento é imperdível pra pais e filhos que curtem leitura. Eu e Gabo batemos ponto lá todo no...rsrs
Já foi no MAM, no Centro Cultural da Cidadania, agora esse ano vai ser no Centro de convenções Sul América.
Muuuuitos estandes de editoras, mostrando as novidades, bate-papo com autores e ilustradores, biblioteca, é muito legal!
E nem venha com desculpa de que a grana tá curta,viu? Vale pela experiência de estar entre livros, ver de perto quem escreveu/ilustrou aqueles livros q os pimpolhos adoram e tem mais: toda criança que for ao evento ganha um livro!
Daqueles programas pra passar o dia!!

Maiores informações: http://www.fnlij.org.br/principal.asp
Novo localCentro de Convenções SulAmérica
Av. Paulo de Frontin com Av. Pres. Vargas – Centro – R.J.
Nova data
De 06 a 17 de Junho de 2011

terça-feira, 10 de maio de 2011

Sim, eles existem!!

 Timão e Pumba
 Mufasa e Simba
 Bambi e Tambor
 Mario e Luigi
 Russel (Up - Altas aventuras)
 Sr. Incrível
Carl (Up- Altas aventuras)

sábado, 7 de maio de 2011

Gato 'tira fotos' do cotidiano com câmera no pescoço

O gato Cooper, de 5 anos, tornou-se um "fotógrafo" conhecido graças a um experimento de seus donos. Com uma câmera automática, ajustada para disparar a cada 2 minutos, Cooper registra tudo o que vê durante o dia.
Gato fotógrafo



Foto 10 de 10 - O gato Cooper (foto), de 5 anos, tornou-se um fotógrafo conhecido graças a um experimento de seus donos. Com uma câmera fotográfica, ajustada para disparar a cada 2 minutos, Cooper registra tudo o que vê durante o dia Cater

As imagens mostram outros animais que Cooper encontra nas ruas, seus esconderijos favoritos e os lugares explorados pelo gato na vizinhança de sua casa, em Seattle, nos Estados Unidos.

Michael e Deirdre Cross, os donos do animal, dizem que a ideia os ajudou a conhecer melhor o dia a dia e as necessidades do gato.

Segundo Michael, a ideia começou como um "experimento geográfico" para que o casal pudesse se certificar de que o animal não estava invadindo as casas dos vizinhos ou atravessando ruas muito movimentadas durante o dia.

No entanto, o casal diz ter ficado impressionado com a beleza das fotografias de Cooper.

Desde então, as fotos do animal já foram tema de duas exposições nos Estados Unidos, e são vendidas pela internet por até R$ 500.

Aprendizado

O casal diz que o experimento, que já dura um ano, fez com que eles entendessem melhor as necessidades de seu animal de estimação.

Observando as primeiras fotografias registradas pela câmera de Cooper, eles descobriram que o gato passava muito tempo esperando que os donos o deixassem entrar em casa, por causa da quantidade de imagens feitas da porta.

"Quando descobrimos isso, instalamos uma entrada especial para ele na porta dos fundos. Na semana seguinte, ele já estava mais contente, porque tinha a liberdade de sair e voltar quando quisesse", diz Michael.

"Ao mesmo tempo em que nos deixa vislumbrar o mundo dos gatos, a câmera também provou ser uma forma de comunicação válida."
As fotografias de Cooper também chegaram às redes sociais. O gato tem mais de 12 mil fãs no Facebook.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

Trabalho de artista chinês detido é inaugurado em Nova York

NOVA YORK (Reuters) - Doze grandes cabeças de bronze de animais criadas pelo artista chinês encarcerado Ai Weiwei foram apresentadas ao público em Nova York na quarta-feira pelo prefeito Michael Bloomberg, que descreveu a ocasião como 'doce e também amarga.'
Não se têm notícias de Weiwei, de 53 anos, desde que ele foi detido pelas autoridades chinesas no aeroporto de Pequim em 3 de abril, fato que motivou fortes críticas internacionais. As autoridades chinesas disseram que ele está sendo investigado por crimes econômicos, mas não divulgaram detalhes específicos.
'Os artistas arriscam tudo para criar. Correm o risco de fracasso, de rejeição, de críticas públicas', disse Bloomberg. 'Mas artistas como Ai Weiwei, que vêm de lugares que não valorizam e protegem a liberdade de expressão, correm riscos ainda maiores.'
'O fato de que não sabemos onde ele está nem quando será libertado é muito perturbador', afirmou.
Weiwei estava previsto para estar presente na abertura da exposição, intitulada 'Círculo de Animais.' A obra exposta no Central Park, em Manhattan, é composta de 12 cabeças de bronze de animais, representando as 12 personalidades do zodíaco chinês.
Cada uma das cabeças de animais tem 1,2 metro de altura, pesa cerca de 363 quilos e fica sobre uma grande base de mármore. As cabeças foram inspiradas pelo desenho do relógio-fonte de Yuanming Yuan, um retiro imperial do século 18 nas proximidades de Pequim.

O artista e ativista da China, Ai Weiwei, foi detido pelo polícia “de segurança” daquele país, no último dia 3/04, quando ia embarcar para Hong Kong. A detenção de Ai, conhecido e reconhecido internacionalmente por suas obras, está movendo vários governos no mundo.


A detenção de Ai Weiwei

Nos últimos meses vários dissidentes foram detidos pela tal polícia “de segurança” chinesa (está ficando cada vez mais difícil saber o significado real das palavras!), que parece determinada a, se não apagar, pelo menos calar aqueles que desafiam o governo.
Além de ser considerado um dos mais famosos artistas contemporâneos da China, tanto em seu próprio país, como no Ocidente, Ai é um aguerrido ativista dos direitos humanos e pró-democracia, que denomina direitos universais. Seus protestos pela liberdade datam de 1979, apresentou diversas obras provocativas em 1990 e participou ativamente da concepção do “Ninho do Pássaro”, estádio inaugurado nas Olimpíadas de 2008.
Por outro lado, em 2010, Ai foi impedido de sair do país antes da entrega do Prêmio Nobel da Paz a outro famoso ativista chinês, Liu Xiaobo – que cumpre condenação de 11 anos, desde 2009, por "subverter(!) o poder contra o Estado". Além disso, o artista foi colocado sob prisão domiciliar, após discutir com o governo sobre a demolição de seu estúdio.
Algumas obras do artista:

Instalação de Ai, intitulada Template, feita de portas e janelas de casas destruídas da dinastia Ming e Quing. Só que... também a obra foi destruída por uma tempestade. O artista gostou, achou providencial a contribuição da natureza.
 Bolha, instalação nos gramados de Watson Island (Miami/2008). São 100 esferas de porcelana azul (20x30cm diâmetro), feitas usando técnica chinesa milenar. Cada uma das peças, pesava aproximadamente 41kg, e variavam de acordo com luminosidade do dia.
 Teia de Luz (Tate Liverpool – set./2007)
Cubo de Luz (2008)
 Instalações Soft Ground (Solo mole) e Rooted Upon (Sob Raízes) em Munique/2009

Vasos Coloridos - vasos neolíticos pintados com tinta industrial (2006)

Web of Light (2008)

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Casais gays podem ter assegurados direitos, como pensão e herança.

Supremo reconhece união estável de homossexuais

Em decisão unânime, ministros do STF defenderam os direitos de gays.

Débora Santos Do G1, em Brasília
Os ministros Ayres Britto, relator das ações sobre união homossexual, e Ricardo Lewandowski durante julgamento no Supremo (Foto: Dida Sampaio / Agência Estado)Os ministros Ayres Britto (dir), relator das ações
sobre união homossexual, e Ricardo Lewandowski
durante julgamento no Supremo (Foto: Dida
Sampaio / Agência Estado)
O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, por unanimidade, nesta quinta-feira (5) a união estável entre casais do mesmo sexo como entidade familiar. Na prática, as regras que valem para relações estáveis entre homens e mulheres serão aplicadas aos casais gays. Com a mudança, o Supremo cria um precedente que pode ser seguido pelas outras instâncias da Justiça e pela administração pública.
O presidente do Supremo, ministro Cezar Peluso, concluiu a votação pedindo ao Congresso Nacional que regulamente as consequência da decisão do STF por meio de uma lei. “O Poder Legislativo, a partir de hoje, tem que se expor e regulamentar as situações em que a aplicação da decisão da Corte seja justificada. Há, portanto, uma convocação que a decisão da Corte implica em relação ao Poder Legislativo para que assuma essa tarefa para a qual parece que até agora não se sentiu muito propensa a exercer”, afirmou Peluso.
De acordo com o Censo Demográfico 2010, o país tem mais de 60 mil casais homossexuais, que podem ter assegurados direitos como herança, comunhão parcial de bens, pensão alimentícia e previdenciária, licença médica, inclusão do companheiro como dependente em planos de saúde, entre outros benefícios.
Em mais de dez horas de sessão, os ministros se revezaram na defesa do direito dos homossexuais à igualdade no tratamento dado pelo estado aos seus relacionamentos afetivos. O julgamento foi iniciado nesta quarta-feira (4) para analisar duas ações sobre o tema propostas pela Procuradoria-Geral da República e pelo governo do estado do Rio de Janeiro.
Em seu voto, o ministro Ayres Britto, relator do caso, foi além dos pedidos feitos nas ações que pretendiam reconhecer a união estável homoafetiva. Baseada nesse voto, a decisão do Supremo sobre o reconhecimento da relação entre pessoas do mesmo sexo pode viabilizar inclusive o casamento civil entre gays, que é direito garantido a casais em união estável.
A diferença é que a união estável acontece sem formalidades, de forma natural, a partir da convivência do casal, e o casamento civil é um contrato jurídico formal estabelecido entre suas pessoas.
A lei, que estabelece normas para as uniões estáveis entre homens e mulheres, destaca entre os direitos e deveres do casal o respeito e a consideração mútuos, além da assistência moral e material recíproca.
Efeitos da decisãoA extensão dos efeitos da união estável aos casais gays, no entanto, não foi delimitada pelo tribunal. Durante o julgamento, o ministro Ricardo Lewandowski foi o único a fazer uma ressalva, ao afirmar que os direitos da união estável entre homem e mulher não devem ser os mesmos destinados aos homoafetivos. Um exemplo é o casamento civil.
“Entendo que uniões de pessoas do mesmo sexo, que se projetam no tempo e ostentam a marca da publicidade, devem ser reconhecidas pelo direito, pois dos fatos nasce o direito. Creio que se está diante de outra unidade familiar distinta das que caracterizam uniões estáveis heterossexuais”, disse Lewandowski.
“Não temos a capacidade de prever todas as relações concretas que demandam a aplicabilidade da nossa decisão. Vamos deixar isso para o caso a caso, nas instâncias comuns. A nossa decisão vale por si, sem precisar de legislação ou de adendos. Mas isso não é um fechar de portas para o Poder Legislativo, que é livre para dispor sobre tudo isso”, afirmou o relator do caso, ministro Ayres Britto.
"Esse julgamento marcará a vida deste país e imprimirá novos rumos à causa da homossexualidade. O julgamento de hoje representa um marco histórico na caminhada da comunidade homossexual. Eu diria um ponto de partida para outras conquistas", afirmou o ministro Celso de Mello.
Ministros do Supremo durante sessão sobre união entre homossexuais (Foto: Carlos Alberto / Imprensa STF)Ministros do Supremo durante sessão sobre união
entre homossexuais (Foto: Carlos Alberto /
Imprensa STF)
Julgamento
No primeiro dia de sessão, nove advogados de entidades participaram do julgamento. Sete delas defenderam o reconhecimento da união estável entre gays e outras duas argumentaram contra a legitimação.
A sessão foi retomada, nesta quinta, com o voto do ministro Luiz Fux. Para ele, não há razões que permitam impedir a união entre pessoas do mesmo sexo. Ele argumentou que a união estável foi criada para reconhecer “famílias espontâneas”, independente da necessidade de aprovação por um juiz ou padre.
“Onde há sociedade há o direito. Se a sociedade evolui, o direito evolui. Os homoafetivos vieram aqui pleitear uma equiparação, que fossem reconhecidos à luz da comunhão que tem e acima de tudo porque querem erigir um projeto de vida. A Suprema Corte concederá aos homoafetivos mais que um projeto de vida, um projeto de felicidade”, afirmou Fux.
“Aqueles que fazem a opção pela união homoafetiva não podem ser desigualados da maioria. As escolhas pessoais livres e legítimas são plurais na sociedade e assim terão de ser entendidas como válidas. (...) O direito existe para a vida não é a vida que existe para o direito. Contra todas as formas de preconceitos há a Constituição Federal”, afirmou a ministra Cármen Lúcia.
Preconceito
O repúdio ao preconceito e os argumentos de direito à igualdade, do princípio da dignidade humana e da garantia de liberdade fizeram parte das falas de todos os ministros do STF.
“O reconhecimento hoje pelo tribunal desses direitos responde a grupo de pessoas que durante longo tempo foram humilhadas, cujos direitos foram ignorados, cuja dignidade foi ofendida, cuja identidade foi denegada e cuja liberdade foi oprimida. As sociedades se aperfeiçoam através de inúmeros mecanismos e um deles é a atuação do Poder Judiciário”, disse a ministra Ellen Gracie.
“Estamos aqui diante de uma situação de descompasso em que o Direito não foi capaz de acompanhar as profundas mudanças sociais. Essas uniões sempre existiram e sempre existirão. O que muda é a forma como as sociedades as enxergam e vão enxergar em cada parte do mundo. Houve uma significativa mudança de paradigmas nas últimas duas décadas”, ponderou Joaquim Barbosa.
O ministro Gilmar Mendes ponderou, no entanto, que não caberia, neste momento, delimitar os direitos que seriam consequências de reconhecer a união estável entre pessoas do mesmo sexo. “As escolhas aqui são de fato dramáticas, difíceis. Me limito a reconhecer a existência dessa união, sem me pronunciar sobre outros desdobramentos”, afirmou.
Para Mendes, não reconhecer o direitos dos casais homossexuais estimula a discriminação. “O limbo jurídico inequivocamente contribui para que haja um quadro de maior discriminação, talvez contribua até mesmo para as práticas violentas de que temos noticia. É dever do estado de proteção e é dever da Corte Constitucional dar essa proteção se, de alguma forma, ela não foi engendrada ou concedida pelo órgão competente”, ponderou.
Duas ações
O plenário do STF concedeu, nesta quinta, pedidos feitos em duas ações propostas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e pelo governo do estado do Rio de Janeiro.
A primeira, de caráter mais amplo, pediu o reconhecimento dos direitos civis de pessoas do mesmo sexo. Na segunda, o governo do Rio queria que o regime jurídico das uniões estáveis fosse aplicado aos casais homossexuais, para que servidores do governo estadual tivessem assegurados benefícios, como previdência e auxílio saúde.
O ministro Dias Toffoli não participou do julgamento das ações. Ele se declarou impedido de votar porque, quando era advogado-geral da União, se manifestou publicamente sobre o tema.

Família do Paraná adota um tatu como animal de estimação

A família Pimentel, de Braganey, no Oeste do Paraná, adotou um tatu como animal de estimação. Há oito meses, o ‘Tutu’ foi encontrado sozinho em uma rodovia da região. A mãe da tatu morreu atropelada na mesma estrada.

Quando era menor, o tatu era alimentado com leite em uma colher. Hoje, ele tomou conta da casa. Tem cama, ganha banho, colo e é considerado um membro da família.

“É o irmão mais novo”, diz Claudinei Pimentel, o filho dos Pimentel.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Cidade alemã faz corrida com cadeiras de escritório

Mais de sessenta corredores participam de competição inusitada em Bad Koenig, no sul da Alemanha

BBC Brasil
Uma corrida diferente invadiu as ruas da cidade de Bad Koenig, no sul da Alemanha. Em vez de carros, a corrida foi feita com cadeiras de escritório.
A terceira edição do Campeonato de Corrida de Cadeiras de Escritório reuniu 64 corredores, equipados com capacetes e protetores para pernas e braços. O percurso é de 200 metros com rampas e alguns obstáculos para deixar a competição mais emocionante.
E a velocidade das cadeiras chega a 35 quilômetros por hora. Muitos modificam suas cadeiras para chegar a esta velocidade, mas os organizadores afirmam que os que os corredores precisam mesmo é de pernas em forma.
Um dos favoritos do público foi Heiko Winter, que competiu vestido como cowboy com sua cadeira adaptada, apelidada de Jaqueline. A cadeira Jaqueline, no entanto, quebrou depois de um salto. Winter prometeu a vitória para a próxima corrida.

terça-feira, 3 de maio de 2011

Próteses com picaretas fazem alpinista amputado voltar a escalar

Britânico perdeu a mão esquerda, dedos da mão direita, parte do nariz, pé direito e perna esquerda após acidente

BBC Brasil
Um alpinista que perdeu parte dos membros superiores em um acidente ganhou duas próteses inovadoras, em formato de picareta, com as quais voltou a praticar seu esporte.
Em 1999, o britânico Stephen Ball, 54 anos, sofreu uma queda e ficou várias horas preso em meio a uma tempestade de neve no Monte McKinley, no Alasca (Estados Unidos), a montanha mais alta da América do Norte, com 6,1 mil metros de altura.
Devido ao frio extremo, Ball perdeu a mão esquerda, os dedos da mão direita, parte do nariz, o pé direito e a perna esquerda - que sofreu fraturas em 12 pontos diferentes.

Foto: Caters
Alpinista britânico Stephen Ball mostra suas próteses

O alpinista recebeu as próteses em um hospital de Carlisle, condado de Cumbria, na Grã-Bretanha. Elas foram criadas pelo especialista Phil Myers, premiado por seu trabalho de criação de membros artificiais.
Ball afirma que foi até o hospital apenas para receber a sua nova perna mecânica, mas apresentou a Myers a ideia de ter próteses especiais que o ajudassem a voltar a escalar. Com isso, o técnico foi atrás de equipamentos em lojas de ferragens para criar os membros especiais. Myers criou um sistema para que as picaretas deslizem e tenham a sua posição ajustada.
O alpinista afirma que a adaptação às próteses foi tranquila, e que agora ele escala de uma maneira que não imaginava mais ser possível.
Além das picaretas de Ball, Myers criou ainda um braço mecânico com um sistema de absorção de choque para um motociclista amputado. As duas criações lhe valeram um prêmio da Associação Britânica de Proteticistas.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Academia na Espanha oferece musculação para clientes nus

BBC Brasil

  • A+Uma academia na Espanha apostou numa estratégia inusitada para escapar da crise econômica: começou a oferecer musculação para nudistas. A Easy Gym, em Arrigorriaga, é a primeira do tipo na Espanha.
"Com a crise, notamos que havia menos pessoas usando a academia", disse à BBC Merche Laseca, dona da academia. "Não sou um nudista, embora não tenha problemas com isso. Mas essa iniciativa tem a ver com dinheiro."

Foto: Jordi Alemany i Santanach
Academia em Arrigorriaga, na Espanha, oferece musculação para nudistas
Laseca pesquisou antes de optar pelo público nudista. Ela descobriu duas piscinas locais que já ofereciam sessões mensais para pessoas sem qualquer roupa. Todos os anos, na cidade próxima de Sopelana, há uma corrida de pessoas despidas na areia. Há ao menos 12 praias naturistas na região basca da Espanha, onde Arrigorriaga se encontra, e muitas outras no resto da costa espanhola.
Nudez natural
"Sempre estamos interessados em novas atividades", explica Maite Vicuna, presidente da Associação Naturista Basca, que correu nu na academia na última semana. "Fazer esporte sem roupas é natural - e muito mais confortável", diz. Mas há quem ache que correr sem roupa pode não ser tão agradável assim. Os trajes esportivos, dizem eles, foram inventados por uma razão.
Mas o dono da academia nega que sua proposta seja impraticável. "Ser um naturista não significa ser burro. Se uma mulher precisar, ela pode vestir um top", diz Merche Laseca. "Mas há ciclismo, levantamento de peso e aparelhos: há muita coisa que pode ser feita nu".
A Easy Gym diz prover toalhas para o conforto e prevenir escorregões no equipamento. Mas alguns clientes de academias não se convenceram pelo conceito. "Cada um, cada um", diz à BBC um dono de outra academia em Bilbao. "Mas acho que essa é a coisa mais anti-higiênica do mundo. São suas roupas que absorvem o suor quando você malha", diz Idoya Echevarria. "Então para onde vai todo o suor, se você está nu? Para as máquinas? O chão? Ou para a pessoa a seu lado?"
Mesmo após toda a pesquisa, a dona da academia se decepcionou pela pequena procura na sessão inaugural: só quatro naturistas apareceram. "Mas as pessoas que vieram aproveitaram", diz ela.
A partir de maio, a academia abrirá aos sábados à tarde e aos domingos só para clientes nus. E um professor já foi contatado para oferecer aulas de yoga ao público despido.

domingo, 1 de maio de 2011

Grandes doses de vitamina B podem atrasar ou deter o Alzheimer, diz estudo

Pesquisa da Universidade de Oxford mostrou que a ingestão de vitaminas do complexo B pode ajudar na redução da atrofia cerebral
sxc.hu
Vitamina B pode ajudar a retardar o mal de Alzheimer, e até detê-lo
Dose maciças de vitamina B podem atrasar e até deter o mal de Alzheimer em pessoas idosas, segundo estudo publicado na revista científica online Public Library of Science One. Uma equipe de pesquisadores da Universidade de Oxford, no Reino Unido, com colaboração de cientistas noruegueses, descobriu que tomar grandes doses dessa vitamina diariamente faz com que se atrase a redução natural do tamanho do cérebro que acontece com a idade. Em teste que durou dois anos e contou com a participação de 168 idosos, foi constatada uma redução de até 50% no ritmo de atrofia cerebral, e uma média de 30%.

Entretanto, os pesquisadores mostram prudência, e dizem que é prematuro recomendar a ingestão desse tipo de suplemento vitamínico antes de realizar novos estudos e pesar riscos e benefícios. Nos testes médicos efetuados, foram utilizadas doses 300 vezes superiores à ingestão recomendada da vitamina B12 e quatro vezes os níveis recomendados de ácido fólico. Isso significa que a vitamina foi usada como um fármaco, e não como um suplemento vitamínico, o que requer testes para saber se há riscos associados. A vitamina B é encontrada de forma natural na carne e cereais integrais, e contribui para crescimento e divisão das células, além de fortalecer o sistema imunológico e manter pele e a estrutura óssea saudáveis.
Os pesquisadores administraram doses diárias da vitaminas B12, B6 e B9 (ácido fólico) a um grupo de 84 pessoas enquanto outro grupo recebeu um placebo. Depois de dois anos, os dados apontados demonstraram que os cérebros dos que haviam tomado as vitaminas tinham reduzido menos – apenas 0,76% ao ano – que os do placebo (1,08% por ano), o que representa uma diferença de 31%. No caso dos idosos que melhor responderam ao tratamento, o ritmo de redução do cérebro diminuiu 53%.
Os pesquisadores acreditam que as vitaminas B diminuíram a atrofia cerebral, reduzindo os níveis de um aminoácido presente no sangue, conhecido por homocisteína. As pessoas que tinham os níveis mais altos de homocisteína no sangue foram as que mais se beneficiaram. Segundo o professor David Smith, do departamento de Farmacologia da Universidade de Oxford, um dos responsáveis pela pesquisa, "os resultados são espetaculares".

Aproximadamente 14 milhões de europeus e cinco milhões de americanos têm problemas de memória e outras funções mentais, conhecidas como Deterioração Cognitiva Ligeira, que podem evoluir para Alzheimer. "Esperamos que este tratamento simples e seguro atrase o desenvolvimento da doença de Alzheimer em pessoas que sofrem ligeiros problemas de memória", disse Smith. Para ele, a questão fundamental é saber se a Deterioração Cognitiva Ligeira é só o começo da doença de Alzheimer, ou seja, se é um processo contínuo e progressivo, como ele mesmo suspeita.

sábado, 30 de abril de 2011

Sobras de retalho serão usadas em trabalhos com detentas


Sobras de retalho serão usadas em trabalhos com detentas




O estado do Rio terá um programa de aproveitamento de retalhos da indústria têxtil como matéria-prima para trabalhos de detentos. O programa, batizado de “Tecendo a Cidadania”, é determinado pela lei 5.960/11, publicada no Diário Oficial do Executivo desta quarta-feira (27).
A iniciativa, proposta pelo deputado Átila Nunes (PSL), defende a medida com o argumento de que ela auxilia na solução de dois problemas: “damos destino aos retalhos, reduzindo o lixo produzido pelo setor, e garantimos mais material para ocupação e formação profissional”, explicou o parlamentar.
A regra, sancionada com veto parcial ao artigo segundo, determina que o Governo irá, através da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária, promover parcerias com empresas ligadas à indústria têxtil para recolher os retalhos e separá-los por tipo de tecido. O Executivo terá 60 dias, a partir da publicação da lei, para regulamentar a matéria.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

"Minhas raízes são aéreas"

A travessia de uma psicóloga sem fronteiras que escolheu ver o lado B do mundo
Eliane Brum (Revista Época)
 
 No dia 16 de abril, a gaúcha Debora Noal botou nas costas uma mochila que nunca passa dos 10 quilos. Dentro dela, uma lanterna de cabeça, como as que os mineiros usam, adaptadores de todos os tipos para computador, um gel para lavar as mãos, lenços umedecidos para o banho, um kit de colher, garfo e faca, um canivete, duas camisetas da organização Médicos Sem Fronteiras (MSF), duas calças jeans, um lenço cor-de-rosa para usar na cabeça em regiões muçulmanas, uma jaqueta térmica, um par de havaianas e outro de tênis, um laptop e um dicionário de português/francês/inglês. Levou ainda uma velha boneca da Magali, personagem do criador Maurício de Sousa, que troca de cara (feliz, triste, zangada, etc), para ajudá-la no atendimento a crianças nos lugares mais remotos e perigosos do mundo. Aos 30 anos, a psicóloga Debora partiu para sua décima missão na MSF. Depois de uma preparação de alguns dias em Genebra, hoje ela está no Quirguistão.

Em 2010 houve um conflito étnico entre uzbeques e quirguizes no país da Ásia Central, ex-integrante da antiga União Soviética. Muitos morreram e muitos foram presos. Debora passará de quatro a seis meses trabalhando nas prisões do “Quirgui”, como ela diz. Além de duas missões no Brasil, desde 2008 ela atua em países que a maioria de nós não sabe pronunciar o nome nem onde fica – ou apenas conhece pelo noticiário internacional. Começou pelo Haiti (três vezes, incluindo a República Dominicana), Guiné-Conacri, República Democrática do Congo (duas vezes), e recém voltara de um campo de refugiados do conflito na Líbia quando foi recrutada para o Quirguistão. Sem saber que seria despachada para um país frio, tinha acabado de raspar a cabeça para mudar de estilo.

Dias antes de sua partida, entrevistei Debora por três horas em seu pequeno apartamento em Aracaju, capital de Sergipe, cidade tranquila e praiana que ela escolheu para voltar depois de cada partida. É um apartamento despojado e muito colorido, povoado por lagartixas e girafas artesanais que ganha de presente. Perguntei a ela a razão de tantas cores. E Debora me explicou que as cores são a forma encontrada por ela para representar a variedade de cheiros que seu contato com um mundo diverso de humanidades lhe proporciona – um universo olfativo impossível de definir em palavras. Era desse mundo muito mais rico – que Debora alcança e nós não – que eu queria saber.

Nascida e criada na gaúcha Santa Maria, Debora cursou Psicologia em Santa Cruz do Sul porque buscava uma faculdade comunitária. Depois, trabalhou no Fórum Social Mundial de 2005 e, quando o evento terminou, tentou pegar uma carona para Manaus. Não conseguiu. Acabou em Recife, onde instalou CAPs (Centro de Atenção Psicossocial) em duas cidades do interior pernambucano. Saiu de lá para fazer residência em Saúde da Família em Sobral, no Ceará, mas concluiu que, sem praia, não suportaria o calor de mais de 40 graus. Acabou em Aracaju, onde fez Gestão de Saúde Pública e Saúde Coletiva. Tornou-se funcionária da secretaria estadual de Saúde e percorreu 28 municípios do Baixo São Francisco para compreender as necessidades da população e organizar o atendimento. Até hoje não tem plano de saúde privado e só reserva elogios para a cobertura do SUS na capital sergipana.

Neste ponto da história, a MSF entrou na vida de Debora e o mundo virou – o que era longe ficou perto. Como em filmes de suspense, ela recebe ligações do tipo: “Debora, temos uma missão para você”. Mas, ao contrário do cinema, em que são espiões equipados com armas de última geração que recebem esse tipo de chamada, Debora parte em missões humanitárias. E arrisca a própria vida armada apenas de conhecimento e da ideia de que a humanidade inteira é sua família.

Debora nos apresenta uma realidade que, não por acaso, pouco chega até nós. Depois de ler sua entrevista, pode parecer difícil acreditar. Mas raras vezes conheci alguém tão leve, transparente e feliz. Os olhos de Debora brilham enquanto conta sua experiência. Nos momentos de maior brutalidade se turvam – e depois voltam a brilhar. Ela não perde nenhuma oportunidade de rir e sua voz é sempre suave. E, quando abraça as pessoas, abraça. Dá vontade de se tornar amiga dela pelo resto da vida. Deve ser por isso que a legião de amigos de Aracaju a espera no aeroporto com champanha e balões quando ela chega estropiada de mais uma missão.

É isso. Debora é com certeza uma das pessoas mais vivas que conheci. E esta é uma entrevista ao mesmo tempo chocante e inspiradora. Dois adjetivos que só alguém com as qualidades de Debora, capaz de arrancar esperança nos cenários mais brutais, poderia acrescentar a um mesmo substantivo. Por isso, foi também uma entrevista muito difícil de cortar. Depois de bastante sofrimento, consegui deixá-la em um terço da original. E guardar o restante para outro momento. Vale cada linha. E meu sonho é que todos possam lê-la e ser movidos pela vontade de compartilhá-la com os amigos e também com desconhecidos.

A foto abaixo foi escolhida por Debora e feita em Porto Príncipe, no Haiti, em 2009. A criança em seu colo se chama Estelle. Sua família queimou suas duas mãos e seus dois pés numa chapa quente, causando queimaduras tão graves que a menina correu o risco de sofrer a amputação dos membros. Durante todo o tratamento, Estelle só aceitou o toque de uma pessoa: Debora.

O que Debora diz é vital. Espero que, ao ler a entrevista a seguir, cada leitor possa alcançar Debora e incluir uma porção maior de mundo dentro de si.
Arquivo Pessoal
Como você foi parar nos Médicos Sem Fronteiras?
Debora Noal
– Vige! É uma longa história.

A gente tem tempo...
Debora –
Um dia um amigo me disse: “Ó, Débora, acho que você tem todo o perfil para trabalhar nos Médicos Sem Fronteiras. Você nunca pensou nisso?” Eu nunca tinha escutado sobre os Médicos Sem Fronteiras na minha vida. Não sabia nem o que era isso. Acho que era janeiro ou fevereiro de 2008. Aí eu falei... “Nossa, Médico Sem Fronteiras? Não sei...”. Ele disse: “Dá uma olhada no site...”. Mas a minha vida era bem conturbada nessa época e eu nem olhei.

Como era sua vida nesse momento?
Debora -
Eu tinha um consultório com dez pacientes, que atendia à noite, fazia mestrado em Saúde Coletiva, tinha um emprego no Estado que eu adorava e morava numa cobertura de frente para o mar. Só eu e minha gata Filomena. Mas esse meu amigo ficou martelando. E eu acabei me inscrevendo. Dois meses depois eles abriram uma prova de seleção. Eu não sei se você já chegou a dar uma olhada no site, mas tem de fazer um monte de testes. Depois de você mandar seu currículo, você tem de ir fazer os testes e as entrevistas pessoalmente. Tem teste prático, técnico, de equipe, de gestão, uma entrevista em português e depois uma entrevista na língua que você escolher, que pode ser inglês ou francês.

E que língua você escolheu?
Debora –
O francês. Eu passei em tudo, mas eles me falaram: “Olha, você tem de melhorar o seu francês. Tem que ter francês fluente pra ir”.

Como era o seu francês nesse tempo?
Debora -
Era uma porcaria... muito ruim. Eu tinha um namorado que era francês, um parisiense. E a gente conversava muito. Mas era meu único contato com a língua. Se eu namorasse um inglês provavelmente teria escolhido o inglês e teria sido mais tranquilo. Mas eu voltei e estudei muito francês, sozinha. Eu fazia supervisão nos 28 municípios do Estado e ia escutando um CD com as aulas em francês até chegar lá. Chegava lá, trabalhava e voltava escutando. Um dia eu estava indo para uma reunião de trabalho em que eu seria promovida e ganharia um salário maior. Eu estava a caminho quando me ligaram dos Médicos Sem Fronteiras: “Olha, a gente está te ligando porque encontramos a sua missão”. Nossa... e qual é a minha missão?

É forte essa história de: “Encontramos a sua missão....”
Debora -
Então, como assim, encontraram a minha missão? “É, porque teve um furacão em Gonaives, no Haiti, e há muitas pessoas feridas. A gente gostaria de saber se você está disponível para partir nesta semana”. Era setembro de 2008. E eu... “Como assim? Eu fiz um teste meses antes e vocês estão me ligando hoje para saber se eu posso partir nesta semana...” Eu com toda a minha vida estruturada, tudo. Aí eu voltei para casa e falei: “Filó, mudança de planos. Vamos mudar de casa!”. E aí, foi.

Mas o que fez você aceitar esse, sei lá, “chamado”? Largar tudo e se jogar?
Debora –
No final daquela conversa com aquele amigo que me falou dos Médicos Sem fronteiras, ele disse: “Sabe, Debora, eu acho que há coisas que a gente precisa pensar... porque provavelmente alguém, em algum lugar do mundo, está esperando por você”. Eu fiquei pensando... É, teoricamente isso não faz nenhum sentido. Alguém, em algum lugar do mundo, está esperando por mim? Ok, né? Mas essa frase ficou, ficou bem forte. E aí, quando a recrutadora me ligou e falou – “Olha, encontramos a sua missão” – eu pensei: o que é um mestrado e um emprego fixo e uma cobertura de frente para o mar e uma gata, o que é? Não é nada...

Como assim “não é nada”? Para a maioria das pessoas é tudo...
Debora –
Dinheiro, estrutura material, nunca foi o meu forte. Não é uma coisa que me toca muito. Acho dinheiro ok, é legal. É bem interessante, você consegue fazer um monte de coisas. Mas sem ele você também consegue fazer um monte de coisas. E acho que, se você se apega a isso, a alguma coisa que é material, isso quer dizer que você está plantando sua raiz por uma estrutura material. Eu quero ter raiz, mas raízes aéreas, que eu possa levar para onde eu quiser.

E aí, você largou tudo e se foi para o Haiti?
Debora
– A gata ficou com a vizinha, uma amiga minha do Sul. Fui lá, deixei a Filomena com todas as bagagens na casa dela. Pedi demissão, acabei o mestrado, tudo para passar um mês. Porque era uma missão de urgência. Entreguei o apartamento, deixei os móveis no meio do corredor porque não tinha condições de distribuir tudo rápido. Só que essa missão se prolongou para quatro meses e meio...

Foi fácil esse desapego pelas suas coisas?
Debora -
O que não é possível carregar comigo é porque não é meu. As pessoas diziam... “Mas você vai deixar tudo? Máquina de lavar no meio do corredor, televisão... e se roubarem?” Se roubarem, roubaram... O que eu vou fazer? Não posso passar minha vida inteira segurando uma televisão na mão... Lembro que eu ia recebendo emails dos vizinhos ao longo dos meses. “Posso ficar com a sua máquina de lavar roupa?” Pode. “O seu quadro está no meio do corredor... posso botar na minha casa?” Pode. E aí, quando eu voltei, foi bem legal, porque fui indo em cada vizinho, tocando na porta... Você tem alguma coisa minha? “Tenho, seu guarda-roupa está aqui...” Foi bem interessante.

Me fala mais desse perfil dos Médicos Sem Fronteiras que é tão você...
Debora –
Eles buscam alguém com muito interesse de prover cuidado para o outro. A gente brinca sempre que na MSF o primeiro objetivo principal é o beneficiário, o segundo objetivo principal é o beneficiário, o terceiro é o beneficiário, o quarto é o beneficiário, o quinto, talvez, o staff nacional, o sexto, o expatriado, que são as pessoas como eu, que saem do seu país para prover o cuidado de alguém. Isso, dentro de uma estrutura de saúde pública, não é muito comum. Eu trabalhava muito no Estado, tipo manhã, tarde e noite. Todo mundo me dizia: “Por que você trabalha tanto? Não tem necessidade...” Como não tem necessidade? Tem muita coisa para organizar. A gente discutia muito em equipe. E as críticas eram: “Super Debora”. Mas isso não era no sentido positivo, mas no sentido negativo. Tipo: “Você está aqui nos matando... dá uma folga! Deixa a gente respirar”. Tanto que, quando eu pedi demissão, todo mundo falou: “Ah, agora ela encontrou o lugar da vida dela! Um lugar que precisa muito, e que tem muita gente com o mesmo perfil, do tipo ‘não sossega’”. Acho que vem muito ligado a isso, de ter esse desejo de prover um cuidado para o outro. Eu lembro que eles diziam: “Mas não é ninguém da sua família...”. Sim... mas qual é o seu conceito de família?

Qual é o seu?
Debora –
Família, para mim, pode ser o cara que está do outro lado da rua. Ok, ele não tem o mesmo sangue, eu nunca vi ele na vida, mas a minha família eu também vejo muito pouco. Então, se o parâmetro é esse, pessoas que você vê com muita frequência, bom, então o meu vizinho é a minha família. Ou a pessoa com quem eu trabalho, ou o gestor que eu estou vendo todo dia na coordenação... Então esse cara é a minha família, se esse é o conceito. Sempre tive um prazer bem grande de viver em família, mas tomando em consideração esse conceito de família bem ampliado. Pode ser qualquer pessoa. Não tenho essa pretensão do mesmo sangue ou do mesmo nome ou de uma história pregressa. E a maioria das pessoas nem conhece a história pregressa da sua família, né? O cara que está lá no Congo, no meio de um conflito armado, também é da minha família. É ser humano? Está valendo.

Como é uma missão?
Debora –
Em missão todo dia é segunda-feira de manhã. Não existe sábado, não existe domingo. Você acorda e é segunda-feira, no outro dia é segunda-feira de novo, e no outro ainda é segunda-feira, e todo mundo tem muito... muito brilho no olho. Sabe? É segunda-feira, mas olha só, tem de fazer isso, isso e isso. A gente briga muito, discute muito, mas todo mundo tem um foco. Ninguém duvida de que o foco principal é o beneficiário, que tem gente que precisa de ajuda, que precisa ser cuidada.

Todo mundo sabe que faz algo que dá sentido à sua vida...
Debora –
É assim.. você está cansada, você está aniquilada, mas a alma está salva, você está se sentindo bem com o que está fazendo. Não tem nenhuma conotação religiosa, a gente até brinca que somos os “ateus sem fronteiras”. A gente acredita no cuidado com o ser humano. Não dá para esperar uma entidade – tomara que ela exista, e tomara que ela um dia comece a se organizar de uma outra forma, porque o mundo é bem cruel. Mas a gente precisa cuidar agora.

Mas nessa primeira missão, especialmente, deve ter dado um frio na barriga, não? Porque as coisas na vida são um pouco duras também...
Debora –
Um pouco, não. São muito duras. Mas embora eu não seja nenhuma Pollyanna, nunca acho que as coisas vão dar errado. Eu sempre tenho certeza que vai dar certo. Mesmo quando der errado, é porque está dando certo. O meu único medo era realmente com a língua. Eu não tinha medo do que ia encontrar lá. Eu não tinha medo de um novo furacão, como é sempre uma possibilidade em um desastre natural. Isso não me inquietava. A minha inquietação era com o francês – como é que vou me comunicar? Por que eu sou psicóloga, né? Eu trabalho com a fala. Então o significado da palavra é muito importante. E o meu receio era: será que eu vou conseguir compreender o significado da palavra do outro? Depois da minha primeira missão compreendi que o significado da palavra, numa catástrofe, é muito pequeno. É muito o que você sente quando está junto com o outro, e o que ele consegue te passar de sofrimento. E quais são as consignas que ele te passa de sofrimento.

E o que são consignas?
Debora –
Consignas são os códigos que ele está te passando de sofrimento. E que, normalmente, não são transmitidos pela fala. Porque são comunidades e sociedades muito pouco trabalhadas no sentido material, tendo como parâmetro uma estrutura social ocidental como a nossa, com educação, escola... São pessoas que normalmente falam muito pouco, mas que corporalmente são muito expressivas. Só que cada comunidade se expressa de uma forma. Para você conseguir compreender os códigos de sofrimento que o outro está te passando, você precisa de tempo. E é muito interessante. Eu estou indo agora para a minha décima missão. E fui ficando muito rápida para perceber as consignas do outro – a forma como cada um se expressa, nem tanto com a palavra, mas a forma corporal também. E é interessante porque o trabalho é muito diferente do que é numa urgência ou do que é num consultório, por exemplo. O trabalho é muito diferente porque você não tem o tempo que você tem no consultório, você não tem a estabilidade que você tem na urgência.

Como assim?
Debora –
Num trabalho de urgência aqui no Brasil, por exemplo, a urgência é do outro, não é a sua urgência. Mas, quando você está numa catástrofe, a urgência também é sua, porque você também está sob o efeito da catástrofe natural. Por exemplo, no terremoto eu estava atendendo as pessoas e o chão estava tremendo. Então eu também estava dentro de uma estrutura de perigo, que é a grande diferença da urgência que a gente vive aqui. Quando eu estava dentro de uma ambulância do SAMU ou quando eu estava dentro de uma Unidade de Pronto Atendimento, eu sabia que a urgência era do outro. Ele estava vindo de um contexto de desastre, mas eu não participava daquele desastre, eu participava de um outro momento, que era uma possibilidade de estruturar e estabilizar psicologicamente uma pessoa. Lá, numa catástrofe, não. Você está junto, você vivencia a catástrofe junto com o outro. É uma forma de dizer para o outro: ok, você não está sozinho, estamos juntos nessa. Isso é bem maluco.

E como você faz?
Debora –
De várias formas. Às vezes, só pelo fato de você estar dentro do mesmo espaço físico que ele, você está mostrando que ok, é perigoso, mas se eu estou aqui e estou te dizendo que funciona, você pode ficar. Como, por exemplo, dentro das unidades que a gente montou no terremoto no Haiti. Depois de 24 horas tudo ainda tremia: as unidades de saúde tremiam, o chão tremia muito, e eu lembro que cada vez que começava um novo tremor de terra as pessoas tinham o ímpeto de sair correndo. Só o fato de você estar ainda dentro da estrutura e de dizer para a pessoa – “Olha, o engenheiro já disse que essa unidade não vai cair se tiver um outro terremoto até 7.0, então a gente pode ficar, e vamos ficar juntos” – já muda. E a outra maneira é investigar coisas bem práticas: que tipo de coisa você pode ir fazendo para se estabilizar. Quase sempre o pedido é o mesmo: “Me ajuda a esquecer”.

E como você responde a um pedido como esse?
Debora –
A minha resposta é sempre a mesma: “Infelizmente eu não posso te ajudar a esquecer. Lembrar, você vai sempre. O que eu posso fazer é te ajudar a lembrar dos eventos com menos sofrimento”.

E como se faz isso?
Debora –
Se faz com um pouco de técnica, um pouco de tempo e muito do desejo do outro de querer elaborar o evento que ele vivenciou. E que não é fácil. Você perde nove pessoas de sua família ao longo do tempo ou você perde tudo – sua casa, seu trabalho, tudo aquilo que você lutou muito para construir e que para a maioria dos seres humanos são coisas muito importantes. Então você chega quando nem elas mesmas gostariam de estar naquele lugar. Essa é a grande especialidade, acho, da organização – chegar quando nem mesmo as pessoas que vivem lá queriam estar naquele lugar. E é nesse momento que você chega. E às vezes você faz um atendimento e fica guardado na cabeça das pessoas para o resto da vida. Você pode mudar completamente o destino de uma pessoa com um simples atendimento.

Me dá um exemplo concreto...
Debora –
Vou dar o exemplo da dona Marie, do Congo. O LRA (Lord’s Resistance Army – Exército de Resistência do Senhor), que é um grupo de rebeldes do governo ugandês que promove vários ataques na fronteira entre o Burundi e o Congo, ataca pessoas como a dona Marie. Essas pessoas atacadas não falam nem a mesma língua, não sabem por que o exército e os rebeldes ugandenses atacam suas comunidades. Lá não existe televisão, não existe internet, não existe rádio, então elas não têm noção de que existe um conflito armado, muito menos que elas estão sendo alvos de um conflito armado. A cidade, Niangara, é considerada o coração da África. Tem inclusive uma pilastra que diz: “Você chegou ao coração da África”.

Deve ter sido muito difícil chegar até lá no meio de um conflito...
Debora –
Muito difícil. A gente desceu em Isiro com um avião pequeno e depois fez oito, nove horas naquelas camionetes tracionadas para chegar a esse lugar. Tudo poderia acontecer no meio do caminho, tudo. Nós éramos a primeira equipe a tentar chegar lá para ver qual era a real situação. A única coisa que a gente sabia é que as comunidades estavam sendo atacadas e que eram ataques muito cruéis. Os rebeldes chegavam nessas comunidades próximas a Niangara, onde as pessoas moram em casas de barro com palha. Os rebeldes jogam fogo nas casas durante a noite e, quando as pessoas estão saindo, eles atiram com aquelas Kalashnikov, que são metralhadoras que não travam. Então eles podem matar muitas pessoas ao mesmo tempo. Alguns morrem queimados, outros morrem de tiros, outros morrem degolados. Outros ainda morrem de hemorragia, porque eles cortam as cartilagens com faca: as orelhas, a ponta do nariz, os lábios. E muitas meninas e mulheres morrem de estupro, de hemorragia após o estupro. Porque os estupros são coletivos. De 30 a 40 homens estupram uma única mulher. Eles fazem os maridos e os filhos segurarem a mulher enquanto os homens estupram em massa. São requintes de crueldade impressionantes.

E foi isso o que aconteceu com Marie?
Debora –
Essa mamãe Marie me tocou muito – eu digo mamãe porque lá todo mundo se chama de mamãe, todo mundo que é mulher se chama mamãe alguma coisa, e homem se chama papai alguma coisa. É um título de respeito. Fazia 24 horas que a gente tinha chegado quando mamãe Marie apareceu. E eu lembro que ela chegou desesperada. Uma mulher muito magra, alta, com a roupa completamente rasgada – porque eles estão sempre com um pedaço de pano amarrado nas pernas para fazer uma saia, um outro amarrado em cima para fazer uma blusa, e normalmente um terceiro para amarrar um bebê. Todos da mesma cor. E ela chegou muito rasgada. E ela disse: “Eu não tenho nenhum motivo para viver, mas me disseram que aqui tinha uma branca que ajudava as pessoas”. Eu falei: “Bom, vamos ver, né? De que ajuda você precisa?”. Ela morava com seis filhos e o marido. Quando um dos filhos estava saindo do le marché (pequenas feiras no meio da rua), alguém gritou: “Corre, porque acabaram de matar teu marido na estrada”. E ela disse: “Como assim, mataram meu marido?”. E disseram: “Os LRA encontraram teu marido na estrada e mataram. Corre do povoado porque eles vão matar todo mundo”. Ela falou: “Mas eu tenho seis filhos dentro de casa...” E aí ela voltou para a sua comunidade, com seu bebezinho amarrado na cintura, e pegou os filhos. E saiu correndo para o meio da floresta, que é mata fechada. Só que no meio do caminho ela percebeu que estava com cinco crianças. Faltava a de dois aninhos. Ela deixou os filhos na floresta e correu de volta para casa com seu bebê amarradinho. E viu a pequenininha dentro de casa, queimando, junto com todas as coisas. Desesperada ela correu para buscar os outros que estavam no meio da floresta e caminhou durante muitos dias dentro da mata fechada com as cinco crianças, sabendo que o marido já tinha morrido, para conseguir ajuda. E aí conseguiu chegar a outro povoado, que era onde morava a mãe dela. E, alguns dias depois, o LRA alcançou essa comunidade e ela sofreu um estupro coletivo. Dezenas de homens a estupraram. E depois mataram dois dos filhos dela. Mamãe Marie seguiu fugindo, mas a cada ataque foi diminuindo o número de filhos dela. Quando ela chegou a Niangara ela tinha apenas um bebê, que era o que estava amarrado na cintura. E ela disse: “Eu não tenho nenhuma razão para viver”.

O que aconteceu com os outros filhos dela?
Debora –
Foram mortos e uma menina sequestrada. É muito comum sequestrarem meninos e meninas. As meninas são escravas sexuais. Durante todo o tempo em que estão sequestradas elas se deslocam na floresta junto com os guerrilheiros. E os meninos são sequestrados para carregar as armas e os roubos em grandes balaios sobre a cabeça. Os guerrilheiros saqueiam as comunidades, queimam as casas, atiram nas pessoas. Isto tudo é uma forma de demonstrar poder diante do governo congolês, que se posicionou contra essa força armada ugandesa. Porque até então os congoleses não tinham sido alvos dos guerrilheiros ugandenses. Mas a partir do momento em que o governo congolês se posicionou contra esse tipo de conflito, eles começaram a atacar as comunidades. Mas não existe informação. Então as pessoas são atacadas sem saber por quê. Logo que eu cheguei, eu não conseguia entender. Como assim? Foi atacada, mas por quê? Mamãe Marie dizia: “Não sei, não sei quem são essas pessoas, eu não sei por que fui atacada, não sei por que eles mataram meu marido, por que mataram meus filhos. Só sei que eu não tenho nenhuma razão para estar viva. Eu não tenho nada. Eu tenho um bebê. E vou cuidar como desse bebê se eu não tenho como trabalhar?”. É uma comunidade que vive de trocas. Não há dinheiro. Então você troca serviços para poder viver. Mas você vai trocar o que quando você não tem nada? Eles vivem de plantar coisas na floresta. Desmatam uma parte da floresta, plantam e aí aquilo ali serve de troca no mercado. Só que quando você não tem mais sua terra, você vai fazer o quê? E eu lembro que no dia em que a encontrei, pensei: como eu posso ajudar uma pessoa dessas? Ela perdeu tudo... E eu era a única psicóloga nesse lugar, a única. Não tinha nem mesmo um psicólogo nacional, ainda não tinha tradutor, eu tinha acabado de chegar à cidade e, se você me perguntar como fiz o atendimento, até hoje eu não me lembro, porque eu não falo a língua dessa mulher. E eu escutei toda essa história...

Em que língua?
Debora –
Ela falava “lingala”.

E como você a escutou em “lingala”?
Debora –
Você começa a se dar conta que a consigna do sofrimento não precisa de muitas palavras. Até porque a pessoa está em estado de choque, então ela tem muita dificuldade de se expressar. Normalmente ela expressa com o corpo, com o olhar, com a forma de levantar o pescoço, a forma de gesticular. E eu me lembro de ter pedido ajuda para escrever a história dela, porque eu precisava descrever para poder organizar algumas coisas mais práticas. Onde ela vai dormir agora? O que ela pode comer? Onde ela pode se vestir? Nesse lugar a postura e a forma de se vestir são muito importantes. Para você ter uma ideia, as pessoas entram no rio antes de irem para o hospital: lavam todas as roupas, colocam na margem do outro lado e ficam nuas dentro do rio esperando secar, porque só têm uma peça de roupa. Quando as roupas secam, elas saem do rio, vestem e só então vão ao hospital. Mesmo depois de um estupro, depois de terem sido baleadas, depois de terem sido mutiladas. Elas têm uma preocupação em chegar limpas e a vestimenta é importante.

E como você fez para ajudar uma mulher que tinha vivido isso?
Debora –
Eu perguntei a ela o que a fazia feliz antes disso tudo acontecer. Se ela lembrava a última vez em que tinha sido feliz. E ela disse: “Hoje eu não lembro, mas eu vou tentar me lembrar”. E eu falei: então, Marie, você pode voltar amanhã? E ela disse que podia.

E ela voltou?
Debora –
Depois disso, eu fui encontrar outras mulheres da comunidade. Contei a história dela. E as mulheres a acolheram dentro de casa. São pessoas que moram em quatro, cinco, num espaço do tamanho do meu banheiro. Não tem divisória, não tem cozinha, é fogo de chão do lado de fora da casa, faz muito calor. E as mulheres encontraram um lugar para ela dentro de casa. Do tipo: “Você é bem recebida dentro da nossa comunidade”. E ela ficou muito surpresa. Ela nunca vira essas pessoas na vida e essas pessoas estavam dispostas a acolhê-la. E no outro dia ela voltou e me agradeceu muito. Ela disse: “Eu me lembrei da última vez em que eu fui feliz”. E quando foi, Marie? Ela falou: “Foi quando eu dancei”.

Nossa...
Debora –
E aquilo ficou... dançou, tá bom. Eu fiquei pensando em como montar um grupo terapêutico, porque a Marie foi só a primeira. Como ela, nessa missão, houve mais de 200 mulheres que eu atendi, sozinha, num espaço de um mês e meio, dois meses. Mulheres e meninas violentadas. Meninas de dois anos de idade, de três anos de idade, de 10, 15, que eram violentadas, estupradas, mutiladas. E eu lembro que o grupo terapêutico nessa comunidade foi de dança. Elas dançavam e com a dança elas contavam a sua história. Era muito bonito. Eu não entendia nada da música, mas eu sabia que a música tinha um conteúdo muito triste. Elas dançavam sempre numa roda e junto com a música cada uma contava a sua história. E choravam e se abraçavam e continuavam contando sua história e dançando. Para mim, cada dia era um ensinamento diferente. Ok, o sofrimento existe, a dor é frequente, a dor é permanente, mas quando a gente está no coletivo isso tudo é dividido. E a dança mostrava isso: a gente não pode parar. E velhinhas de 70, 80 anos, dançavam e saltavam indo até o chão e levantando de novo, porque as danças são muito expressivas. Nessa época, eu já tinha uma tradutora. Ela falou: “Vou te contar uma das músicas”. E era assim: “Quando eu cheguei aqui razão nenhuma eu tinha para viver, agora eu tenho não só uma razão, mas tenho uma família de novo. Tudo eu perdi, mas se Deus quis que assim eu tivesse uma comunidade e uma nova família, então eu fui aceita, e assim eu aceito. E assim agora tenho uma nova vida, uma nova razão para viver”.

É terrível e lindo ao mesmo tempo. Como você sai de uma missão como essa? Como você vive depois de ter vivido isso?
Debora –
Eu saí arrasada. Caramba, não fiz nada por essas pessoas. Tinha muita coisa que precisava ter sido feita. Elas precisam de paz. Não existe saúde, não existe felicidade num lugar onde você não tem paz, o princípio básico da humanidade. Na época eu trabalhava com a seção belga. Então, cheguei à Bélgica muito mal. Fui fazer meu relatório e contei sobre o número de pessoas que estavam sendo violentadas. Disse que a gente precisava fazer alguma coisa. E falei: “Eu estou mal porque não me importo de passar a minha vida inteira atendendo essas pessoas em forte sofrimento, mas eu me importo de saber que amanhã, depois de amanhã, e depois e depois e depois elas vão continuar sofrendo esse mesmo tipo de violência se isso não parar. Agora a primeira necessidade é uma equipe de paz. Como fazer isso?”.

E como fazer?
Debora –
Nós temos jornalistas dentro da organização. Temos um compromisso com a denúncia quando existe qualquer tipo de ferimento aos Direitos Humanos. Me encaminharam para o serviço de comunicação e falaram: “A gente vai fazer alguma coisa”. Eu saí de lá, e os jornalistas foram. E fizeram reportagens e documentários. Divulgaram. Um ano e pouco depois, em 2010, eu voltei para lá. Normalmente depois de um estupro, no Congo, uma mulher não pode mais casar. Não tem mais o direito de casar porque ela não é mais virgem e porque ela já teve a sua primeira experiência. Então ela é alguém que está “suja”. E um dos trabalhos era mostrar para os homens e a comunidade que não, ela não estava suja. E que era preciso rever algumas estruturas da cultura. E, quando voltei, eu perguntei: “Onde está o meu grupo?”. E a resposta foi: “Todas casaram”. E elas vinham à minha sala de consulta mostrar seus bebezinhos, apresentar o marido, os sogros. Vinham com a família inteira. Eu falei: “Gente, não acredito!”.

Reinventaram a vida....
Debora –
Literalmente. Reinventaram uma forma de viver. E elas estavam felizes. E eu fiquei muito feliz.

Essa missão do Congo foi a mais dura para você?
Debora –
Sim, no sentido de que nós éramos a única organização que estava lá. O medo era perene a noite inteira. Eu tinha muito receio, porque eu via as mulheres, a forma como eram cometidos os estupros. E eu era a única mulher nessa missão. Eram 14 homens e eu. Então eu sabia que, se os rebeldes ugandenses entrassem na nossa casa, o desastre e a violência que eu atendi o dia inteiro aconteceriam comigo. Então a dor era constante. Foi um mês e meio, quase dois meses, de dor 24 horas. De dia, o dia inteiro, enquanto existia luz, a dor era compartilhada, minha com elas. E durante a noite, o medo – aí o medo era só meu. Quase a noite inteira sem dormir, pensando. Cada folha que mexia do lado de fora do quarto, eu pensava: podem ser eles. Porque a gente não sabia até onde os ataques poderiam chegar. Um dos ataques chegou a sete quilômetros de onde a gente estava. Muito perto mesmo. Barulho de tiros, as pessoas gritando, fogo, então a gente sabia que, se chegasse à comunidade, nós também seríamos alvo.

E como era esse medo?
Debora –
Bom, luz a gente já não tinha. A gente usa sempre lanternas na cabeça para se locomover, para ir à latrina, para qualquer coisa. E o meu medo era de tudo. Medo de dormir profundamente, porque sabia que, se eu dormisse um sono mais profundo, perderia a possibilidade de me proteger, se houvesse necessidade de fugir. Ao mesmo tempo, o medo de...ok, mas vou fugir para que lado? Tinha medo de sofrer uma violência sexual, que é uma coisa que me toca muito. Desde que me formei eu trabalho com violência sexual. Aqui, inclusive, em Sergipe. Foi um dos motivos de eles terem me chamado para a organização – por ter uma expertise de trabalho com mulheres violentadas. E é uma coisa que sempre me tocou muito porque, quando você escuta o sofrimento de alguém que vivenciou uma violência sexual, é como se você compartilhasse a história dessa pessoa, e você acaba vivenciando um pouco da história dela. E as histórias são muito doídas. Alguém que entra dentro de você é alguém que te invade, te dilacera. Como elas mesmas dizem: “O meu braço, você pode quebrar, ele vai se reconstituir. Mas por você ter entrado dentro de mim, eu nunca vou poder te tirar”. E essa é uma dor muito forte. Então, o meu receio também era de estupro. Inclusive, pelos estupros serem coletivos, as mulheres têm fístulas depois. O canal da vagina e do ânus viram um canal só. Então você não consegue mais conter nem sua própria urina nem suas fezes. Você está andando na rua e sente que sua urina está saindo. É muito triste. E há ainda a vergonha de ir a um espaço público, por exemplo. Elas vão ao hospital e não querem sentar na cadeira. Você diz para elas: pode sentar! “Mas eu não quero...” Até eu me dar conta de que elas não se sentavam porque tinham medo de fazer xixi ou de fazer cocô em cima da cadeira, porque elas não conseguem sentir quando vai sair... Uma delas me contou que ficam de um a dois dias sem comer nem beber nada antes de ir a uma consulta, para não fazer xixi nem cocô dentro do hospital, ou dentro da estrutura de saúde. Você imagina o sofrimento de alguém que, a cada vez que tem de ir a um espaço coletivo não pode comer nem beber um ou dois dias antes? É muito sofrimento. Mas é interessante, porque também tem beleza nesse lugar, e também tem riso, também tem desejo de vida. É um negócio impressionante. A missão tem de ser feita com todos os sentidos: o que você escuta, o que você vê, o que você toca, o que você sente, o que você cheira...

Como é o cheiro?
Debora –
Cheiro é uma coisa difícil de contar para as pessoas. O cheiro da morte é um negócio difícil de descrever. Como você descreve o cheiro da morte? Cheiro de ser humano. No Brasil, a gente tem muito pouco cheiro de ser humano. Porque ser humano não cheira bem, o ser humano cheira mal. Tipo: fique sem colocar seu desodorante, sem passar xampu no cabelo, sem passar um bom sabonete no corpo, sem passar um creme, um protetor solar. E sinta seu cheiro daqui a uma semana. É um cheiro forte de gente. E eu vivo sentindo cheiro de gente, em todos os lugares. Normalmente, nos lugares aonde eu vou não existe xampu, não existe sabonete, não existe desodorante. Cheiro de ser humano é um negócio impressionante. E o cheiro do medo do ser humano é uma coisa forte, também. E o cheiro da morte, mais ainda. No Haiti, depois do terremoto, havia muitas pessoas amputadas. E o cheiro daquele sangue, dois, três dias depois... O cheiro daquelas pessoas em decomposição, ainda vivas, é um cheiro muito forte. Muito, muito forte, que não dá para descrever. Posso descrever para as pessoas o rosto, a postura de dor, de sofrimento, mas o cheiro eu não consigo descrever. É uma das coisas mais fortes que eu senti naquela missão. O cheiro da morte. Primeiro, você começa a perder a capacidade de sentir seu próprio cheiro, imagina o cheiro dos outros. E, depois de um tempo, você começa a perceber que tudo cheira, inclusive o medo, a morte, a dor, a felicidade – tudo tem seu próprio cheiro. E às vezes é bem doído.

E como você se vira em cada volta de missão? Porque eu faço algumas reportagens complicadas, nem perto da sua experiência, mas mesmo assim acho complicado voltar e sofro bastante. Como você faz?
Debora –
Eu preciso voltar para um lugar onde esteja sozinha. E por isso Aracaju é uma ótima escolha, porque é calma e tranquila. Normalmente eu tenho alguns registros das viagens. Registro escrito, ou foto, ou alguma gravação. Eu revisito tudo isso, revejo as fotos, olho algumas filmagens, imagens que eu gravo, coisas que escrevi. Reviso tudo de novo. Não remexo, não reedito as coisas, o que está escrito está escrito. Naquele momento era tudo o que eu podia fazer para elaborar minha vivência naquele lugar. E eu preciso revisitar várias vezes. E eu preciso de água. É a razão de eu estar morando aqui em Aracaju até hoje. Preciso de mar, preciso caminhar, andar de roller na praia, tomar minha água de coco. Uma parte do meu projeto terapêutico é dormir até quando eu tiver vontade de dormir, comer quando tiver vontade, beber quando eu tiver vontade...

Você deve ficar totalmente esgotada...
Debora –
Na missão, você não sente que está cansada. Você está com a sua química corporal tão alterada, é tanta adrenalina, é tanta excitação, que você não percebe. E eu só percebo quando entro no avião e me dá um sono incontrolável. Não escuto nada. Eu lembro até de uma vez em que eu perguntei: “Moço, já decolou?”. E ele começou a rir: “Faz mais de 15 horas, e nós já estamos chegando ao Brasil”.

Você faz terapia?
Debora –
Quando eu volto faço terapia todos os dias ou três a quatro vezes por semana. Brinco com minha terapeuta: “Eu trouxe um monte de coisas para digerir junto contigo”. Preciso desse tempo para digerir. Mas tenho feito missões muito rápidas, uma seguida da outra. Tipo: voltei da Líbia no dia 30 de março e agora estou indo para o Quirguistão. Só duas semanas entre uma e outra.

Dá tempo de digerir tudo o que você viveu em duas semanas?
Debora –
A primeira semana é para digerir. A segunda, para me preparar. Tipo agora, né? Tem computador em todas as salas aqui de casa, porque eu estudo em um, cansei, vou estudar em outro. Estudo um pouco da cultura, um pouco da língua, alguns hábitos, e faço um pouco de preparação psicológica para o que vou vivenciar, para tentar avaliar até onde eu posso ir nesse lugar.

É fácil para você partir desses lugares?
Debora –
É como eu te disse. Eu não costumo focar muito no que fica, mas no que eu estou indo buscar. Como no sofrimento: você tem sempre uma alternativa. Não é o evento, em si, que te causa a dor. É o significado que você dá a ele. Às vezes me incomoda partir sem ver algumas respostas. Mas sei que o mundo não para quando eu vou embora. O mundo continua. E aquilo que você faz quando você está lá tem reverberações dentro das pessoas e dentro dos espaços. Então, é uma dor do tipo: estou indo embora, não vi o resultado disso, mas alguém vai ver. E tomara que aconteça. Mas não chega a ser uma sensação ruim. Tem uma sensação boa: estou voltando para casa, vou dormir, vou tomar banho de verdade, vou comer... Tem uma sensação boa, como quando eu saio daqui. Dominic, o recrutador do Rio, me liga, dizendo: “Debora, temos uma missão para você”. Mas, para mim, parece que ele diz: “Debora, você acaba de acertar o bilhete premiado da Loteria Federal, e você ganhou sozinha!”. É a minha décima missão, mas cada vez que ele me liga é uma felicidade, uma sensação bem maluca. Ele está me dizendo que aconteceu um furacão, um terremoto, e eu estou muito feliz porque sou eu que fui chamada para ir nessa missão. Podia ser qualquer outra pessoa, mas escolheram a mim. E me dá uma sensação boa, sabe? Sou eu que estou indo vivenciar isso, dividir isso com aquelas pessoas, naquele momento, naquele lugar. É uma sensação maluca, tipo: o salário não é bom, as condições de vida não são boas, a segurança e a estabilidade são zero, e ainda assim eu sou a pessoa mais feliz do mundo cada vez que ele me liga dizendo que estou indo. Você lembra daquele programa em que a pessoa ficava com os ouvidos cobertos dentro de uma cabine? Aí o apresentador ficava fazendo propostas....(ela imita a voz) “Você troca sua casa na praia, uma cobertura, por uma caixa de fósforos?” E a pessoa: “Sim!!!” De olhos fechados, sem ouvir nada, a pessoa super feliz... sou eu. Você troca a sua vida de ir para a praia, tomar água de coco, caminhar na orla, ficar no seu apartamento, tomar um banho gostoso para tomar banho de caneca no meio do mato, dentro de um conflito armado, com risco de vida? Siiiiiim!!! (risos) O ser humano não é congruente nem lógico... então, ok.

Quando você olha para trás, lá na sua infância, você consegue enxergar a arquitetura que levaria você a esse caminho?
Debora –
Eu sou filha de pessoas bem libertadoras, que nunca me podaram. Quando eu fiz 15 anos, escrevi uma carta para meu pai e minha mãe agradecendo por terem me dado asas para eu saber que podia voar para qualquer lugar e também raízes para saber que podia voltar sempre que precisasse. Meus pais sempre foram muito caseiros. Meu pai era relojoeiro e minha mãe, advogada. Nunca foram de viajar muito. Foi depois que eu comecei essa minha vida bem nômade, bem “caminhadeira” no mundo, que a minha mãe resolveu sair, virar nômade. Mas acho que a razão é que, além de eles terem sido muito libertadores, eles sempre foram muito confiantes na nossa escolha. Desde pequena eu escuto: “Na tua cabeça tem um guia. Se você acredita que dá para fazer, vai e faz”. Minha mãe sempre dizia e diz até hoje. “Mas o que você acha, minha filha, você acha que isso vai dar certo?”. E eu sempre acho que vai dar certo. “Então faz”, ela diz. “Você tem mais coisas dentro de você do que consegue me dizer. Então, se acha que dá para fazer, faz”. Desde pequena era assim.

Você e sua família são muito próximas até hoje?
Debora –
Sim, mas somos muito autônomas. Meu pai faleceu em 2003. Minha mãe e minhas duas irmãs têm cada uma a sua vida, em cidades diferentes. Uma irmã é advogada e a outra, fisioterapeuta. Não fazemos o tipo meloso. Nós sabemos que para ter carinho e cuidado não é preciso estar fisicamente presente o tempo todo. Você pode cuidar e acariciar alguém, mesmo a distância. Nos encontramos sempre no Natal, em Santa Maria. Talvez seja isso que me dê facilidade para ir, mas para voltar também. Eu não tenho dificuldade para ir, mas também não tenho para voltar. Não me causa dor voltar para casa. Me causa felicidade: vou ficar em casa, vou dormir...

E você sabe que não está fugindo de nada...
Debora -
Até porque eu me levo para todo lugar, né? Eu não tenho como fugir. Eu estou junto comigo o tempo todo.

E quais são seus sonhos?
Debora –
Ser feliz. E é bem amplo isso, mas ao mesmo tempo é bem restrito. Não são grandes planos nem desejos. Eu vou fazendo coisas que me dão a sensação de estar viva, de estar feliz. Faço coisas que me dão a sensação de que ainda brilha o meu olho. Acho que quando eu olho para alguma coisa que eu sinto... hum, isso não faz meu olho brilhar... eu não fico. Posso estar ganhando o melhor salário do mundo, posso estar num lugar extremamente estável e confortável. Não é isso que me dá o grande prazer. É a sensação de estar viva. Acho que tem muita gente no mundo que não está viva. Está andando por aí, mas viva não está.

Como é estar viva?
Debora –
Eu preciso dessa sensação boa, sabe, de encontrar os humanos por aí. Mesmo com tanta falta de humanidade nesses espaços para onde vou. Mas humano é isso tudo: essa crueldade, mas também essa riqueza; essa maldade, mas também esse acolhimento do outro. Quando você não tem nada, mas você ainda tem espaço para acolher alguém dentro de você, é interessante, bem interessante. E aí você se dá conta de que o material não é nada. Nada. Tipo... um terremoto pode terminar com tudo isso daqui. E aí quando as pessoas dizem (ela imita a voz): “Mas como, você acabou de comprar seu apartamento e já vai abandonar?”. Eu comprei um apartamento, não comprei uma algema para botar no meu pé. Um apartamento é um lugar para onde você pode voltar quando quiser, ele não vai fugir. Um dia ele pode desaparecer num terremoto, num maremoto, qualquer coisa pode destruir ele. E se esta for a razão para eu viver, talvez eu nunca consiga me recuperar da tragédia dessa perda. Mas acho que, quando o ser humano quer uma razão para viver, ele encontra. Seja uma pedra... talvez uma pedra dê razão para você viver. Você diz: essa pedra aqui é mágica, você vai encontrar a sua sorte com ela. Pegue nessa pedra e atravesse esse rio. Ok. Talvez essa pedra seja uma razão para viver.

O que você vive transforma você o tempo inteiro, claro. Mas há alguma transformação mais concreta que você possa contar?
Debora –
Não sei... talvez tenha sido um encontro. Acho que agora é mais claro para mim. Eu acredito que você tem muitas coisas dentro de você, sempre. Todo mundo tem muita coisa dentro de si. Você só faz aquilo que cola. É como se fossem vários ímãs. O seu pólo só cola em coisas que você já tem. Se não, não colariam em você. Talvez com essas vivências tenham ficado mais evidentes em mim algumas coisas. Especialmente essa relação com o material. Nunca foi muito o meu forte dinheiro e coisas palpáveis. Mas agora faz menos sentido ainda. Bem menos. Eu lembro quando no Congo eu recebi as diárias, o dinheiro para sobreviver naquele lugar. E eu lembro que eu estava morrendo de fome, e era de tarde já, e não tinha nada para comer na casa. Lembro que eu perguntei: “Não tem nada aí para comer? Estou com muita fome”. E a moça disse: “Teve um ataque ontem, lá no mercado, e não sobrou nada. Não tem nada”. E você se dá conta do valor do dinheiro – um pedaço de papel que é significado puro. E, naquele dia, por exemplo, ele não significava nada. Eu não podia comprar nada com o meu dinheiro. Estava lá, com o dinheiro dentro do bolso e não tinha um grão de arroz para comprar porque não havia paz naquele lugar. E aí você começa a se dar conta de qual é o valor das coisas materiais. Você não come o seu dinheiro. Você não come o seu salário. Há outras coisas ali que têm uma importância e um significado muito maior e que não são coisas físicas. As coisas materiais te dão uma sensação de paz, mas é apenas uma sensação de paz, não é a paz. Não é a saúde, não é a riqueza. É uma sensação de tudo isso. Que pode ser destruída muito rapidamente. Talvez isso tenha ficado mais evidente para mim. Já tinha um significado, mas não tinha essa força que tem hoje.

O que mais você percebeu depois de viver no limite do humano?
Debora –
Tem me caído muitas fichas sobre beleza e estética. Em cada lugar que eu vou, a sensação de percepção da estética e da beleza é muito diferente. E me encanta, me encanta mesmo.

Fiquei curiosa para visualizar mamãe Marie. Como ela é?
Debora –
É uma mulher bem alta, magra, muito magra. Uma mulher que chama a atenção pelas cicatrizes no rosto. Ela é de uma tribo onde as mulheres fazem cortes muito bonitos no rosto quando ainda são jovens. A estética desse lugar é uma estética muito interessante. Nada a ver com a estética que a gente valoriza no mundo ocidental, mas uma estética muito forte, onde as marcas do rosto dizem de onde você vem e qual é a sua história. Como tatuagens. São cicatrizes que vão contando a história dessa mulher. Nesse lugar, as mulheres ou raspam o cabelo ou têm o cabelo muito comprido. Não existe o meio termo. Ou elas têm tranças enormes, que é um grande símbolo de beleza. Ou são mais velhas e têm o cabelo raspado, o que também é um símbolo de beleza.

E nos outros lugares onde você foi, como era vivida a questão da beleza? O que era o belo?
Debora –
Em Masisi (Congo), as pessoas têm os dentes bem separados. E elas serram para ficar mais separados. Isso, esteticamente, é muito bonito. Eu sempre pergunto: “O que é um homem muito bonito aqui? Uma mulher muito bonita?”. Eu sou muito perguntadeira. E eu me lembro de um dos psicólogos nativos me contando: “Ah, uma mulher bem bonita aqui é a minha mulher. A minha mulher é a coisa mais linda do mundo”. O nome dele era Dodô. “Ah, Dodô, e como é a sua mulher?” E ele a descreveu: “Minha mulher é bem alta, é bem gorda, ela tem os dentes bem separados, e ela tem umas tranças...” Na minha cabeça ocidental, eu fiz a imagem de uma mulher com seios grandes, bem magra, acinturada, com bunda, perna firme. E eu fui fazer uma seleção, e a mulher dele também era psicóloga e concorreu. Quando eu a vi, levei um susto. Então essa é a mulher linda dele! Era uma mulher muuuuuito grande, muuuito gorda, com os dentes muuuito separados. Uma mulher bem masculina, bem forte. Bem, mas bem gordona. Do tamanho desse sofá (de dois lugares). E eu pensei: “Essa então é a beleza”. E depois eu fui perguntando para outras pessoas no caminho o que era uma mulher bonita, quem era uma mulher para casar... Porque eles sempre diziam: “Essa é para casar, essa não é para casar”. Aí eles respondiam: “Como assim, você não sabe o que é uma mulher para casar?”. Porque quando você está dentro da sua cultura, você acha que todo mundo compartilha, né? Uma mulher para casar, naquele lugar, é uma mulher grande, forte, que consegue suportar o peso de dois bebês sobre o próprio corpo, que consegue capinar e preparar a horta e que ainda tem forças para, quando chegar em casa, arrumar as coisas. Só que eles estão falando isso não com uma conotação machista, mas com uma conotação de: “Como você não sabe? É assim”.

Você, pequena e magra, estava completamente fora do padrão de beleza local...
Debora –
Eu sempre estou completamente por fora dessa beleza. Eu sou o lado B da beleza desse lugar... (ri). Lembro que uma vez um homem de lá até falou: “Você é tão bonita, pena que seja muito magra. E os dentes, também, são muito juntinhos...” (ri muito) Eu fico pensando que uma pessoa que não se sente bem com sua aparência só precisa rodar o mundo. Você sempre vai encontrar alguém que procura exatamente você.... e nada mais do que você mesmo. Tem gosto, cultura e estrutura para tudo nesse mundo.

E a vivência da sexualidade também deve ser muito diferente, não?
Debora –
Eu lembro que uma das aulas é sobre sexualidade. Como se desenvolve a sua sexualidade? Como casar depois de ter sido estuprada? Como ter uma relação sexual com alguém depois de ter sido violentada? E eu lembro de uma pergunta que me marcou muito, de uma mulher de uns 45, 50 anos: “Mamãe Debora, como é fazer amor com alguém com carinho?”. Você imagina alguém que é casado há muito tempo e que não sabe o que é fazer amor com alguém, ter cuidado e ser cuidada?

E o que você respondeu?
Debora –
Eu expliquei um pouco como era no mundo ocidental, que nem todos os homens são carinhosos, nem todas as mulheres são carinhosas, mas que existem, sim, estruturas de carinho, que o carinho também é uma estratégia cultural. Mas que nem todas as culturas desenvolvem esse tipo de estratégia. Essa mulher então me disse: “Se eu mostrar para ele que estou sentindo prazer, vou ser considerada uma prostituta. Será que você pode falar com meu marido para dizer a ele que isso não é coisa de prostituta?”. Posso. Pode tudo num lugar desses. Todos os tipos de intervenção são possíveis. Existem, sim, várias consignas, mas não existe um padrão que tem de ser seguido. Cada pessoa é um mundo de necessidades e um outro mundo de possibilidades. E você tem de saber que tipo de necessidades tem esse mundo e como fazer essa ponte com o mundo das estratégias de cada um.

E você falou com o marido dela?
Debora –
Falei. Foi interessantíssimo, porque os homens não falam nesse lugar, né? Cabeça baixa... ainda mais com uma mulher. Imagina um homem negro, afro, subsaariano, falando para uma mulher sobre sua vida sexual. Não sei se por sorte ou azar, nesse lugar as mulheres brancas são consideradas assexuadas. Não somos nem homens, nem mulheres. Acho que isso facilitou bastante. E eu lembro que ele disse assim: “No mundo dos brancos funciona assim?”. Eu falei: “Não no mundo de todos os brancos, mas a gente não precisa dizer que tem um mundo de branco e um mundo de negro, mas que isso pode se constituir das duas formas. Inclusive, no mundo de onde eu venho existem homens brancos e homens negros. Eu não vivo num mundo só de brancos. Vivo num mundo onde existem, sim, muitas pessoas negras, e que algumas sentem prazer, outras não sentem. Mas que isso, sim, é possível. Você não precisa ser profissional do sexo para você sentir”. E eu me lembro das perguntas dela: “Mas eu faço como?”. Porque nesse lugar é muito diferente. Os prazeres são diferentes. A forma de sentir prazer é diferente.

E como é?
Debora
– Aqui você vai à farmácia para comprar um lubrificante para uma relação sexual. Lá é diferente. Você compra pílulas ou você usa ervas para estar ressecada na relação sexual. Então, normalmente, um presente de casamento é ou uma pílula, para você se ressecar, ou ervas para você secar sua vagina antes da relação sexual. Para que sua vagina esteja bem seca na hora de ter uma relação. Então você imagina a dor de um estupro, né? Porque a mulher obviamente já está ressecada.

E o prazer é por estar seca?
Debora –
Não da mulher, o prazer do homem. Quando eu pergunto para elas se sentem prazer, elas dizem: “Não, sinto dor”. É uma das razões de o número de casos de DSTs (doenças sexualmente transmissíveis) ser muito alto. Elas já têm muito mais fissuras, muito mais contato de sangue, muito mais contato de secreção. Você precisa então dar algumas dicas sem interferir diretamente em uma cultura, porque esse não é o meu trabalho, nem o trabalho de ninguém, o de desconstruir uma estrutura que está dada. Mas quando uma pessoa diz: “Essa estrutura não me dá prazer, essa estrutura me machuca, essa estrutura me fere, me causa sofrimento, bom, aí minha intervenção é possível”. E funcionou. Para essa pessoa, pelo menos, funcionou. Para esse casal.

Como você sabe que funcionou?
Debora -
Ela me disse. Bateu na janela do meu quarto e sussurrou: “Funcionou!”. (risos)

Como é para você esse contato com o mal humano? Esses homens que queimam, mutilam, estupram e matam sem sequer conhecer. Nem mesmo é pessoal. Como você lida com isso?
Debora –
Eu sempre acho que tudo tem uma razão, um significado. Por mais que a gente não entenda. Eu imagino que mesmo essas pessoas têm dentro da cabeça delas uma razão. Estou entrando no meu terceiro ano de MSF e ainda não consegui entender essa estrutura de maldade. Se me falarem: “Você precisa fazer um atendimento de uma pessoa do LRA”. Eu vou fazer. E vou tentar entender com ele o que está acontecendo e como se estrutura isso. Eu até brinquei uma vez com meu chefe. Eu falei: “Me deixa fazer o atendimento deles. Eu preciso entender o que está acontecendo”. Não consigo entender como alguém consegue fazer isso com uma menina de 11, 12, 13 anos. Ainda para mim é incompreensível. Mas eu gostaria de entender. Eu sempre acho que tem, sim, uma razão, que tem uma história atrás disso, e que talvez isso explique. Que não justifica, não justifica. Você pode me contar 100 mil histórias. Eu acho que isso explica, sim, mas não justifica. Mas... ok. O meu trabalho é este: atender as pessoas que ali chegam. Não importa de que lado que elas vêm, não importa que tipo de acontecimento se passa na vida delas ou se passou. O meu trabalho é aliviar o sofrimento humano, seja ele de onde venha, seja ele a cor que tenha. E dá para fazer isso. É a razão de eu continuar. Porque se eu achasse que não dava para diminuir o sofrimento, que não dava para ajudar as pessoas a escolherem novas estratégias de felicidade para a vida, talvez eu não estaria nesse lugar. De todos essas nove missões, eu não me lembro de alguém dizer: “Eu não encontrei uma razão para viver”. Muitas pessoas, principalmente no Haiti, diziam: “Eu não quero mais viver”. Na África, já é mais difícil você encontrar essa fala. Eles dizem: “Eu não tenho nenhuma razão para viver”. Mas estão lá, com aquele olhar do tipo: “Mas me ajuda a encontrar?”. Me ajuda a fazer a metamorfose desse sofrimento em vida mesmo, em felicidade? E às vezes a felicidade pode ser um grupo de dança, pode ser uma caminhada coletiva em algum lugar, pode ser um abraço... Como uma mulher de 70 anos me disse uma vez: “Nunca ninguém me abraçou”. Ela tinha sido estuprada e seu corpo era todo arqueado, enrijecido. Em cada lugar o estupro tem um significado diferente e, para aquela etnia, violentar uma mulher mais velha conferia poder ao estuprador. Então eu a abracei. O afeto pode, sim, fazer uma grande diferença. Eu não vou mudar o mundo, com toda certeza, mas eu posso mudar o mundo de uma pessoa durante algum tempo que pode ser uma hora, duas horas, 24 horas. Tá bom, sabe? Se todo mundo tiver uma hora, ao menos, de intensa felicidade, um sentimento bom de acolhimento, tá bom. É suficiente. Se em 70 anos ela nunca recebeu um abraço, por que eu não posso fazer uma grande diferença com um abraço, com um toque?

E como você lida, Debora, com a indiferença? Explico: você volta para o Brasil e muita gente não está nem aí, não é? A maioria das pessoas, de fato, não está nem aí para o sofrimento do outro. Se interessa apenas em cuidar da própria vida ou no máximo daqueles que considera sua família de sangue.
Debora
– Isso é bem difícil. Quando eu volto, as perguntas são sempre as mesmas. Mas as reações também são muito parecidas. As perguntas vêm do encantamento de alguém que escuta uma história de filme. O interesse termina quando termina a mesa de bar, ou quando termina a conversa na rua ou na praia. Isso me assusta um pouco, sabe? Até onde você se sente tocado para mudar uma história? Não estou dizendo que todo mundo precise fazer esse trabalho, nem que todo mundo precise ser muito militante, não é isso. Mas é uma sensação de que as pessoas se conformam com tão pouco, sabe? Muitas choram, até. Mas quando eu termino de contar é como se desligassem a TV. Ou saíssem da sala de cinema. A tristeza dura a emoção daquela cena. E é uma pena que eu não consiga fazer com que as pessoas sintam a dor daquelas pessoas naquele momento.

Parece que não há conexão, não é?
Debora –
Uma inquietação, pelo menos... Não quero que o mundo inteiro seja triste, não quero que o mundo inteiro fique mal, não é isso. Mas como tocar o lado A do mundo? Como tocar essas pessoas que estão dentro desse contexto estável, dentro de suas vidas tranquilas, de seu carro novo? Ok, como fazer com que essas pessoas pensem em uma forma de fazer do mundo um lugar um pouco diferente? Não quero que todas estejam na África ou que todas vão para o Haiti, mas acho que cada um pode fazer uma coisa muito pequena para poder mudar isso, sabe? Coisas bem pequenas, mesmo, que você pode ir mudando. Tipo: eu estou te contando que tem trabalho escravo nesse lugar. Ok, você pode não comprar um produto desse lugar. Ou estou te falando que nesse lugar existe determinado tipo de violência. O que você pode fazer com isso? Eu acho que você sempre consegue fazer alguma coisa. Dentro do nosso país, mesmo, tem muita coisa para ser feita e acho que a gente não faz porque essa tranqüilidade – ou essa acomodação com roupagem de tranquilidade – dá uma sensação de conforto para as pessoas.

E como você lida com isso?
Debora
– Isso ainda me inquieta. Essa roupa não é o meu número, sabe? Me dá um desconforto. Mas enquanto eu não sei o que fazer com isso, eu vou trabalhando com esse outro lado. Não dá pra fazer tudo ao mesmo tempo. Isso é o que eu consigo fazer nesse momento: contar essas histórias quando eu volto e apenas quando me perguntam, porque se não me perguntarem eu não digo nada. Não tenho essa vontade de dizer para todo mundo: “Sabe o que eu estou fazendo?”. Não tenho. Mas, se vierem me perguntar, estou sempre disposta a falar. Mesmo que às vezes seja repetitivo.

E isso não te dá uma solidão muito grande na volta?
Debora –
Acho que nas primeiras duas, três missões, eu me sentia um pouco solitária. Eu queria contar mais detalhes. Mas as pessoas querem ouvir até certo ponto. No ponto em que começa a tocar muito o sentimento, o sofrimento, a angústia, e que elas não conseguem traduzir isso em uma ação ou um significado mais concreto, elas começam a ficar desconfortáveis nessa escuta. Então nessas primeiras duas, três missões, era um pouco... como assim? As pessoas não querem ouvir mais? Mas hoje eu já compreendo. Ok, elas não escolheram esse mundo para elas, eu não tenho o direito de forçá-las a um mundo que não querem. Cada um tem a sua escolha. Inclusive, a escolha de dizer: “Eu quero viver nesse outro mundo”. E a alienação também traz felicidade. Você não saber de tudo, você não saber de uma série de penúrias e de desgraças do mundo também te traz um conforto e uma sensação de felicidade de.... Ok, tudo o que eu sei é que meu filho está bem alimentado, dormindo num bercinho bonito, que acabei de reformar o quarto dele com um arquiteto. Está tudo ótimo. Tipo, a alienação também é isso, também traz conforto. Mas eu não escolhi esse lado. Eu escolhi saber, eu escolhi ver.

Como é escolher ver?
Debora –
Rico, bem rico. É uma sensação de ter muita gente dentro de mim. Eu já sou muitas, né? Sou muitas mulheres e muitos homens também, sou muita gente. É uma sensação de... (permanece um pouco em silêncio) estar muito plena. Plena de história, de tudo. Plena...

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